segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

O Planejamento no Contexto da Globalização

O Planejamento no Contexto da Globalização
Prof. José Amado

O tema que nos arvoramos a discorrer guarda relativo grau de complexidade, por sua modernidade e pelas paixões que provoca naqueles que procura interpretar o seu processo. A globalização, no nosso entendimento, bifurca-se em duas grandes dimensões: a da produção e das finanças. A primeira por suas conseqüências mais visíveis é a que tem provocado discussões mais apaixonadas. Entretanto, seguramente, é a dimensão financeira a mais contundente do processo. Nesta aula não nos restringiremos a uma dimensão específica. Nem, por confessado desconhecimento, iremos além da superfície do problema que, trazemos à discussão, com o propósito de instigar os senhores a pensar sobre o assunto.

Com esse objetivo, procuraremos interpretar a globalização através de duas correntes de pensamento. Destacaremos a metodologia de análise denominada de dialética da globalização, que interpreta a globalização a partir da dialética marxista, vinculando-a a evolução endógena do capitalismo com a apreensão das leis de movimento e reprodução do capital e a outra linha de análise, que compreende a globalização como uma revolução que não guarda nenhuma relação de dependência com os processos anteriores.

A guisa de informação e, portanto, sem o propósito de influenciar a melhor forma de entender o problema, revisaremos, de passagem, as duas linhas de raciocínios analíticos:

1 - A Dialética da Globalização

Os seguidores dessa metodologia buscam no “Manifesto Comunista” e no “Capital” as bases de entendimento do processo, associando-o às transformações do capitalismo na visão marxista e toma como ponto de partida o Manifesto, onde dizem encontrar menções que sugerem a globalização assistida hoje, asseverando, que a globalização é um fenômeno presente no capitalismo desde seus primórdios. Vejamos, então, a partir de fragmentos pinçados do “Manifesto Comunista” que, com destacam os biógrafos, o texto foi redigido em 1.848, exclusivamente, por Marx:

...A forma tradicional, feudal ou corporativa, de funcionamento da indústria não permitia atender as necessidades crescentes decorrente do surgimento de novos mercados. Em seu lugar aparece a manufatura (...).

No entanto, os mercados continuaram crescendo, as necessidades aumentando(...). No lugar da manufatura surgiu a grande indústria(...).

A grande industria criou o mercado mundial, ampliado pela descoberta da América. O mercado mundial promoveu o desenvolvimento incomensurável do comércio, da navegação e das comunicações. Esse movimento, por sua vez, voltou a impulsionar a expansão da industria. E na mesma medida que a industria, comércio, navegação e estrada de ferro se expandiam, desenvolvia-se a burguesia, os capitais se multiplicavam e, com isso todas as classes oriundas da idade média passaram a um segundo pleno(...).
A burguesia não pode existir sem revolucionar constantemente os instrumentos de produção, portanto as relações de produção e, por conseguinte todas as relações sociais.

A necessidade de mercados sempre crescentes para seus produtos impele a burguesia a conquistar todo o globo terrestre. Ela precisa estabelecer-se, explorar e criar vínculos em todos os lugares.

Pela extrapolação do mercado mundial, a burguesia imprime um caráter cosmopolita à produção e ao consumo em todos os países (...). As industrias nacionais foram, e ainda são, a cada dia, destruídas. São substituídas por novas industrias, cuja introdução se torna essencial para todas as nações civilizadas. Essas indústrias não utilizam mais matérias-primas locais, mas matérias-primas provenientes das regiões mais distantes e seus produtos não se destinam apenas ao mercado nacional, mas também a todos os cantos da terra (...).

O texto, não apenas descreve a situação da economia na época em que foi publicado, mas, também, expressa a tendência da economia capitalista. É um texto clarividente, se assim podemos chamar. E continua o manifesto:

( ...) com a rápida melhoria dos instrumentos de produção e das comunicações, a burguesia logra integrar na civilização até os povos mais bárbaros, Os preços baratos de suas mercadorias são a artilharia pesada com a qual ela derruba todas as muralhas da China e faz capitular até os povos mais bárbaros, mais hostis aos estrangeiros. Sob a ameaça de ruína, ela obriga as nações a adotarem o modo burguês de produção (...).

Os seguidores dessa linha de análise, concluem que o processo de globalização do capital pode ser caracterizado como aquele que decorre do esgotamento da ascensão do modo capitalista de produção. Mas destaca que o capital, procurando reverter essa tendência de baixa taxa de lucratividade, tem lançado base para completa modificação das formas de produção e organização a partir da inovação tecnológica e de novas teorias organizacionais. Afirmando, entretanto, que essa onda, longe de representar uma redenção que abriria uma nova ordem de prosperidade, traz como conseqüência tendência para a desindustrialização, contração dos mercados e desagregação do próprio mercado mundial. Tendência que tem levado os lideres das nações capitalistas à implementar mudanças econômico-estruturais radicais e destacam Thatcher, Reagan e Khol que, procurando reverter à queda da taxa de lucro, promoveram profunda desvalorização da força de trabalho, privatizações de empresas estatais e a liberalização do fluxo do comércio exterior.

A outra linha analisa o processo de globalização como algo exógeno ao processo de desenvolvimento capitalista, algo efetivamente revolucionário que não guarda relação com fases anteriores, o que descaracteriza a linha de raciocínio anterior, asseverando que “a hierarquização das nações não se modificou em termos de pólos dominantes e que os novos conceitos produtivos e novos produtos podem se dar sem o rompimento do sistema industrial existente”.

Os seguidores dessa linha de pensamento interpretam a globalização como um processo que só pode trazer benefícios e destaca a transferência patrimonial com um desses benefícios.
Essas questões, não obstante inserir-se no contexto de nossa aula, não se constitui no objetivo central da discussão. Trataremos do ajustamento das políticas de desenvolvimento das economias nacionais, face aos aspectos da globalização.

As relações internacionais sempre existiram, entretanto, em um grau que permitia as economias nacionais um amplo leque de ações que lhes davam autonomia para a aplicação de políticas internas voltadas ao bem-estar de suas populações, numa autodeterminação compatível a sua soberania. A globalização não interfere institucionalmente com a soberania das nações, mas limita em grau significativo a margem de manobra de aplicações de políticas públicas. O problema decorre do fato de que, enquanto as nações são politicamente independentes, mas suas economias são crescentemente interdependentes.

Considerando o fato da existência de dezenas ou centenas de políticas monetárias e a não existência de uma arbitragem, é, de certo modo, surpreendente, que as relações econômicas internacionais se desenvolvam tão bem, A maioria dos problemas das relações econômicas internacionais está relacionada com os pagamentos feitos entre as nações e que são registrados no Balanço de Pagamentos.

O Balanço de Pagamento é trazido para essa discussão pelo fato do seu resultado influenciar nas políticas macroeconômicas, em especial na política de juros, oferta monetária, câmbio, etc, variáveis significativas no processo de desenvolvimento econômico.

O Balanço de Pagamento é por assim dizer, o centro nervoso das relações econômicas internacionais, assinalando instantaneamente suas mudanças e acionando os sistemas internos de ajustamento. Sendo, portanto, útil, ao propósito de interpretação de políticas internas, entendidas estas, como a operacionalização de um pleno de desenvolvimento.

Passemos, agora, a analise de alguns dos conhecidos movimentos econômicos engendrados no processo de globalização:

  • Mobilidade do Capital Financeiro – a globalização mais se configura na mobilidade cibernética da movimentação financeira, O capital financeiro gira o mundo realizando sua natureza acumulativa e criando ilusão de riqueza que se desfaz como um castelo de areia à menor brisa. Muitas economias nacionais apresentavam-se ao mundo como verdadeiras ilhas de prosperidade (os tigres asiáticos) e assistiram, num tempo também cibernético, a fuga desses capitais, desmoronando o castelo de área e espalhando terror as economias emergentes. O Brasil viveu essa crise e pagou muito caro.

Deve os países recusar-se a abrigar esses recursos? Claro que não. Não pode, entretanto, sustentar uma política de desenvolvimento tendo esses recursos como suporte.

  • Transferência Patrimonial – essa transferência não ocorre gratuitamente. O que se tem assistido é que ela e precedida de exigências, especialmente as que dizem respeito à reorganização produtiva da economia que, na maioria dos casos só beneficia o capital externo em detrimento dos demais fatores de origem interna.

Essas exigências em geral atingem a capacidade reguladora do estado, bem como sua autodeterminação na gestão do gasto público fragilizando a economia frente aos interesses do capital internacional.

No Brasil, especialmente, em face da rapidez com que ocorreram as mudanças impostas aos países em desenvolvimento pelo “Consenso de Washington”, a necessária montagem de uma estrutura reguladora da nova arquitetura econômica, não acompanhou o extraordinário processo de desnacionalização da economia, desinstrumentalizando o estado em sua ação reguladora contra a tendência de concentração do capital que se configura na oligopolização, cartelização e na formação de conglomerados econômicos de configuração global.

Essa debilidade do estado brasileiro vai de encontro ao interesses público na medida em que não dispõe de instrumentos legais que garantam a pratica salutar da concorrência. Para se ter uma idéia de nosso atraso esse campo específico, os Estado Unidos dispõe de lei anti-trust deste 1890 e o Brasil só em 1995 é que criou uma legislação visando inibir do dumping. Essa nossa fragilidade favoreceu o rápido avanço do processo de mercantilização e privatização do setor público e a ampliação do setor privado, acompanhado do menosprezo de políticas capazes de reduzir as desigualdades sociais e o acesso da conjunto da população à segurança saúde e aposentadoria, etc. Observa-se, entretanto, a proliferação, como nunca, de escolas particulares, planos de saúde e de aposentadoria e segurança privadas, quase sempre acompanhadas do logro da incompetência do Estado.

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